sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Resenhas back-to-back: 15/16

Eu assisti a mais ou menos nove filmes nos últimos 6 dias, e pretendo escrever sobre todos eles. Essa situação exige medidas drásticas, e o que eu decidi fazer foi inaugurar um novo bloco batizado de "Resenhas back-to-back", em que escreverei sobre dois filmes com uma cajadada só em textos mais curtos que o normal.

Os escolhidos de hoje não foram assistidos em sequência (o filme que escrevi entre os dois será discutido isoladamente em outra inauguração de bloco mais tarde), mas são aqueles que inspiraram os textos mais curtos. Uma já saiu de cartaz faz tempo e a outra acabou de entrar, porém eu exorto-vos a desconsiderar a diferença de tempo.

De Pernas pro Ar 2, de Roberto Santucci

Brasil, 2012. Comédia/Romance. 98 min. Direção: Roberto Santucci. Escrito por: Mariza Leão, Paulo Cursino, Ingrid Guimarães e Marcelo Saback. Elenco: Ingrid Guimarães, Bruno Garcia, Maria Paula, Eriberto Leão, Denise Weinberg, Cristina Pereira, Christine Fernandes, Tatá Werneck, Luis Miranda. Classificação indicativa: 14 anos.

Me ocorreu há algum tempo que eu nunca escrevi nada sobre um filme nacional nesse blog, provavelmente porque eu raramente assisto a produções brasileiras (não há um motivo específico para isso, antes que você pergunte). Por circunstância, acabei indo ver essa semana a continuação justamente daquele que, se bem me lembro, foi o último nacional que assisti. E, se De Pernas pro Ar chegava a ser embaraçoso em sua ineptidão, De Pernas pro Ar 2 acabou se revelando uma grata surpresa. Não tão bom a ponto de redimir o primeiro, mas aí já é pedir demais. Pra começar, o orçamento do filme teve um bem-vindo upgrade, eliminando os erros grosseiros de produção que tornavam o primeiro impossível de levar a sério. Em segundo lugar, os realizadores perceberam que enquadrar mulheres conversando sobre vibradores não é suficiente para dar interesse feminino a um flime, e investiram em uma trama que pode agradar tanto a, erm, "mulheres modernas" quanto ao resto do público em geral. E, se é inegável a confusão provocada por ambientar metade da ação em um spa isolado cheio de "figuras" e a outra metade em plena Nova York (o primeiro ato parece até existir apenas para que a projeção alcance 90 minutos), pelo menos o filme é tonalmente sólido.

Ainda assim, a saga de Alice tentando inicialmente relaxar em um spa para depois ir abrir uma filial da Sexy Delícia na Big Apple sofre de muitos problemas herdados de seu antecessor: o furor em torno da rede de sex shops operada pela protagonista continua não convencendo, e a tentativa de imitar comédias americanas se mantém ruidosa, inclusive nos momentos sentimentais envolvendo Alice e seu filho. E os roteiristas ainda acharam uma boa ideia rechear o filme de momentos-anedota — a saber, cenas em que os personagens comportam-se irrealisticamente pelo bem do remate imediato da piada. Mas essa falta de visão de jogo meio onipresente é compensada por uma boa quantidade de sacadas inteligentes, como a aparição pontual, em dois momentos distintos, de uma gravação de Alice quando criança, a qual se mostra reveladora sobre a personagem e sua família. Além disso, é dado mais material à divertida empregada Rosa, e a sua personalidade humilde, se ocasionalmente provocadora de piadas forçadas ("Do you wanna fuck?"), acaba sendo um contraponto saudável à descarada propaganda turística de Nova York que o resto do filme faz — algo que fica acentuado na hilária montagem musical que intercala a fogosa Marcela saindo de lojas de grife com sacolas cheias a Rosa maravilhando-se ao vasculhar as prateleiras de um supermercado.

Mas a melhor coisa a respeito desse De Pernas pro Ar 2 reside no quanto os realizadores parecem conhecer seu público, presenteando-o com referências sutis e detalhes que ajudam a criar um universo cômico interno — repare, por exemplo, no uso econômico do bizarro funk que se tornou música-tema do primeiro filme, ou no esforço em criar uma mitologia em torno do coelho de pelúcia. Também é notável a participação de Rodrigo Sant'Anna, em que os realizadores resistem à tentação de incluir uma referência óbvia a Valéria Vasques e optam por uma alusão sutil no finzinho da participação do comediante. Mas é claro que nada dessa auto-consciência seria suficiente para redimir a historinha medíocre não fosse o elenco, e a boa notícia é que os atores se mostram bem mais afinados do que no primeiro filme — se Ingrid Guimarães precisava carregar o primeiro nas costas e não conseguia, nessa continuação todos os seus colegas de elenco contribuem para o produto final, inclusive a antes risível Maria Paula, que, surpreendentemente, consegue convencer a maior parte do tempo na pele de Marcela. Avaliando De Pernas pro Ar 2 friamente, o filme não merece mais elogios do que uma romcom americana média, mas graças à sintonia dos atores esse conhecimento é disfarçado com sucesso. E já é ótimo que o enfraquecido gênero da comédia nacional esteja chegando a tanto.

Classificação final:

Homens de Preto 3, de Barry Sonnenfeld

Men in Black 3, EUA, 2012. Ação/Comédia/Sci-fi. 106 min. Direção: Barry Sonnenfeld. Escrito por: Etan Cohen. Elenco: Will Smith, Tommy Lee Jones, Josh Brolin, Jemaine Clement, Emma Thompson, Michael Stuhlbarg, Mike Colter, Bill Hader, David Rasche, Alice Eve. Classificação indicativa: 10 anos.

Se você, como eu, não está familiarizado com o universo dos filmes de Barry Sonnenfeld, Homens de Preto 3 pode ser uma boa introdução, já que, desde as cenas iniciais, o roteirista Etan Cohen faz o possível para que nenhum conceito pertinente ao universo maluco dos MIB fique confuso na mente dos não-iniciados. Com o jeitão de um filme-pipoca descompromissado, esse é um daqueles filmes que chegam perto de duas horas e parecem durar 30 minutos, tamanho o seu empenho em entreter uniformemente. E, de quebra, algumas passagens pisam fora da zona de conforto e tornam o filme mais sensível e intelectualmente inspirado que a maioria dos blockbusters. Tomando como ponto de partida dramático a indignação do Agente J com o jeito taciturno e ranzinza de Tommy Lee... err, Agente K, o roteiro começa cedo a se dedicar, ainda que em segundo plano, a explorar a relação entre os dois. Assim, não poderia ser mais conveniente o enredo de viagem no tempo, em que J precisa voltar ao ano de 1969 para impedir que Boris, o Animal mate K e provoque, 40 anos depois, um massivo e incombatível ataque dos Bogloditas à Terra. (LSD much?)

Isso porque, no passado, J conhece a versão menos-de-30 de K, e a interação entre os dois é inspirada, tanto graças ao roteiro quanto à performance de Josh Brolin (detalhes logo mais). Também é divertido ver o quartel-general dos MIB coberto de apetrechos sessentistas — uma prova do senso de humor da produção e dos diretores de arte, e que condiz perfeitamente com a veia cômica quase surrealista estabelecida pelo filme, e que, imagino, sempre foi uma das marcas registradas da série de Sonnenfeld. O segundo ato inteiro é uma brincadeira com o período, na verdade, com piadas que vão de Andy Warhol ao racismo da polícia. Mas, sight gags à parte, nós ainda estamos falando de viagens no tempo, e é irrepreensível a forma como o filme lida com o conceito, incitando dor de cabeça mais de uma vez sem abrir buracos na lógica e aproveitando a deixa para incluir observações sobre linhas do tempo alternativas através do memorável personagem de Michael Stuhlbarg, o arcaniano Griffin. Melhor que a encomenda para o filme 3 de uma cinessérie de sessão da tarde.

Não que Homens de Preto 3 seja perfeito, ou sequer perto disso: o diretor muitas vezes falha em estabelecer equilíbrio entre os momentos propositalmente asquerosos e os diálogos de fogo rápido, e tirando uma ou outra piada visual mais inspirada (como aquela logo no começo que envolve Lady Gaga e dura uns dois segundos), o filme não é lá muito inventivo visualmente. Mas o que se poderia esperar de um filme desses está lá, e em profusão: a maquiagem protética é impressionante, o ritmo é perfeito para um filme com o propósito de entreter, e o notável elenco se compromete ao máximo. O que me leva, claro, a Josh Brolin. Se é possível argumentar que Tommy Lee Jones faz o papel dele mesmo, então Brolin praticamente interpreta Jones — e não poderia ser mais bem-sucedido na tarefa, simulando a cadência da voz do ator e seus maneirismos sutis com perfeição absoluta, e chegando por vezes a nos fazer esquecer que é ele e não Jones que aparece na tela. Mas sua atuação não se restringe à imitação, acrescentando também uma inédita camada de leveza e otimismo ao agente K que enriquece a já delicada (e por vezes tocante) análise que o filme faz da relação entre ele e J. Logo, quando Jones volta a surgir na tela no desfecho, passamos, assim como J, a ver seu personagem com outros olhos, o que, no caso, é um feito e tanto. E, como a aparição final de Griffin confirma, Homens de Preto 3 acaba demonstrando ter conhecimento mais que suficiente da própria proposta, e compondo um argumento convincente para a continuação da franquia.

Classificação final:

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