quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Resenha 14: "Frankenweenie", de Tim Burton

Sparky (Frank Welker) em Frankenweenie. © Disney.
Frankenweenie, EUA, 2012. Animação/Família/Sci-fi/Dramédia. 87 minutos. Direção: Tim Burton. Escrito por: John August. Elenco: Charlie Tahan, Catherine O'Hara, Martin Short, Winona Ryder, Martin Landau, Atticus Shaffer, Robert Capron, James Hiroyuki Liao, Conchata Ferrell, Tom Kenny. Classificação indicativa: Livre.

Tim Burton é um perfeccionista. É sabido que poucos diretores hoje se entregam tanto ao seu ofício e com tanto preciosismo na construção das histórias, dos personagens e dos sets. Como resultado, seus projetos, bicos de produtor à parte, demoram muito tempo para chegar às telas, e são comuns intervalos de dois anos ou mais entre seus filmes. E se estes nem sempre são obras-primas, ainda há que se admitir que esse diretor amado por tantos e desprezado por tantos outros ainda é, no mínimo, um apaixonado pelo que faz. Assim, seria de se esperar que uma obra como Frankenweenie, possivelmente o projeto mais íntimo e pessoal de Burton, se traduzisse em algo inesquecível, nem que apenas pela fascinação de ter um vislumbre da experiência do cineasta. Ao invés disso, pasme, essa terceira animação em stop-motion do ano se revela a mais decepcionantemente medíocre, tanto visual como narrativamente.

Por onde começar? O mote de Frankenweenie é interessante, sugerindo a possibilidade de enfocar as discussões complexas do Frankenstein de Mary Shelley e do filme de James Whale do ponto de vista de uma criança. Em vez disso, o filme nunca parece almejar ser mais do que um spoof desajeitado de filmes de terror — isso porque, apesar de clara a intenção de Burton de contar a história de um garoto e seu cachorro, o roteiro se perde em referências óbvias e algumas não tão óbvias a clássicos que já cansaram de ser parodiados, referências que parecem ter sido incluídas na história simplesmente porque os realizadores pensaram "Por que não?". No geral isso seria perdoável, e até condizente com a atmosfera lúgubre do filme, mas Frankenweenie também parece padecer de excesso de confiança, nunca se esforçando em criar uma história convincente ou mesmo plausível para permear a trajetória pessoal dos dois protagonistas e as dezenas de alusões que a acompanham.

Basta dar um mínimo de processamento aos fatos que alavancam o principal conflito da história para perceber a falta de cuidado (ou seria preguiça?) do roteirista John August: tudo bem que a ideia de um garoto ressuscitando o seu cachorro já jogue a maioria dos obstáculos lógicos pela janela, mas nem por isso é ignorável a unidimensionalidade de crianças que parecem estar dispostas a qualquer coisa, por mais perigosa que seja, pelo que uma delas define como "um troféu grande", ou a função ornamental que cumprem pais que lotam um auditório para derrubar um professor porque não são capazes de entender a ciência (reparem a referência cansada a Plutão). E o que dizer da tensão ridícula criada pela insuportável regra tácita de que os pais não podem saber de nada, por mais dedicados e compreensíveis que sejam?

Todos esses empecilhos ao funcionamento narrativo do filme, juntamente com uma moral simplista, clichês distraidores e personagens secundários que servem apenas como enfeite (ao contrário do que geralmente se vê na filmografia de Burton), parecem apontar que o filme se contenta em agradar apenas às crianças menores — e falha até mesmo aí, desperdiçando uma excelente oportunidade de dar uma lição sobre "viver e deixar morrer" e servindo um happy ending que só não é mais açucarado por acontecer rápido. E se Burton dedica-se um bom tempo a construir uma simpática lógica interna, qualquer traço de coerência é atropelado no clímax, que vê diversos bichinhos de estimação serem ressuscitados apenas para se transformar em monstrengos agressivos, anfíbios humanoides semelhantes aos Gremlins e até mesmo répteis gigantes (!) sem maiores explicações (e chega até a ser ofensiva a decisão de fazer o garoto asiático despertar uma criatura semelhante à Gamera).

Mas a pior constatação que se tem ao assistir Frankenweenie diz respeito ao aspecto visual do filme: por mais duro que seja admitir, a idiossincrasia visual dos personagens de Burton está ficando batida. É só comparar esta com as outras animações em stop-motion do ano (a saber, ParaNorman e Piratas Pirados!), e fica impossível ignorar que esta é aquela em que os personagens tem menos expressão, surgindo quase sempre como versões de massinha da Kristen Stewart, e a existência de personagens de design excêntrico como a Garota Esquisita parece ter a função única de nos distrair desse defeito. É pena, considerando a meticulosidade que Burton dá, como sempre, aos cenários e à direção de arte em geral — além do que, a fotografia em preto-e-branco dá indícios iniciais de uma abordagem não-convencional, o que seria mais que bem-vindo no mundo saturado das animações infantis e condiria com produções em stop-motion de anos recentes, e Burton consegue manter a produção em um patamar saudável de peculiaridade durante os 87 minutos de duração.

Parece até que a minha intenção é destruir o filme, mas na verdade Frankenweenie, no geral, não é ruim. Longe disso. Trata-se de um esforço criativo nobre, com um centro emocional eficaz e sincero, que tem em Victor e seu cachorro Sparky duas das melhores criações recentes do diretor. Fãs de filmes de terror vintage serão facilmente encantados pelas inúmeras referências, assim como os próprios fãs da filmografia de Burton, a qual também é recauchutada extensivamente nas set pieces. O grande problema aqui é uma espécie de confiança excessiva por parte dos realizadores, que, se capazes de criar momentos singelos como aquele em que Sparky finalmente encontra paz ao descansar sobre seu túmulo, também não veem problema em abraçar clichês onipresentes como o do interesse romântico canino. Frankenweenie poderia ser muito pior. Mas também poderia ser muito melhor — e, considerando o potencial em questão, isso é o que marca mais.


Classificação final:

Nenhum comentário:

Postar um comentário